Dossier

water and landscape
AGUA y TERRITORIO

A cartografia morfométrica do relevo como subsídio ao estudo da paisagem: a alta bacia do Rio Capivara – Botucatu (SP) – Brasil

La cartografía morfométrica del relieve como subsidio al estudio del paisaje: la alta cuenca del Río Capivara – Botucatu (SP) - Brasil

Higor Lourenzoni Bonzanini
Universidade Estadual Paulista – Unesp Campus Rio Claro (SP). Brasil
Higor.bonzanini@unesp.br

ORCID: 0000-0003-0135-3361

Cenira Maria Lupinacci
Universidade Estadual Paulista – Unesp Campus Rio Claro (SP). Brasil
Cenira.Lupinacci@unesp.br

ORCID: 0000-0002-4732-1421

Información del artículo

Recibido: 25/07/2022
Revisado: 19/04/2023
Aceptado: 04/05/2023

ISSN 2340-8472

ISSNe 2340-7743

DOI 10.17561/at.23.7304

CC-BY

© Universidad de Jaén (España).
Seminario Permanente Agua, Territorio y Medio Ambiente (CSIC)

RESUMO
A análise morfométrica do relevo busca quantificar características naturais deste elemento da paisagem que podem dificultar o uso da terra em função da intensa dinâmica geomorfológica. Assim, a cartografia morfométrica tem o potencial de auxiliar a identificação de terrenos que necessitam ser resguardados, podendo auxiliar no planejamento ambiental. Diante disso, o objetivo deste trabalho foi identificar setores naturalmente fragilizados, com grande potencial de alteração da paisagem geomorfológica em área de relevo cuestiforme, na alta bacia do rio Capivara, em Botucatu (SP). Para isso, foram elaboradas as cartas de declividade, dissecação vertical, dissecação horizontal e de energia do relevo, evidenciando setores naturalmente suscetíveis a ocorrência de processos erosivos, que são ainda afetados pelo uso inadequado da terra. Conclui-se que a cartografia morfométrica, ao fornecer informação para que o uso da terra seja realizado considerando as limitações impostas pelas características naturais do relevo, pode colaborar com a compreensão da dinâmica da paisagem e, portanto, ser utilizada como instrumento de gerenciamento dos espaços ocupados.

PALAVRAS-CHAVE: Processos Erosivos, Energia do Relevo, Relevo de Cuestas, Planejamento Ambiental.

RESUMEN
El análisis morfométrico del relieve busca cuantificar las características naturales de este elemento del paisaje que pueden dificultar el uso del suelo debido a la intensa dinámica geomorfológica. Por lo tanto, la cartografía morfométrica tiene el potencial de ayudar a identificar áreas que necesitan protección y puede ayudar en la planificación ambiental. Por lo tanto, el objetivo de este trabajo fue identificar sectores naturalmente frágiles, con gran potencial para cambiar el paisaje geomorfológico en un área de relieve cuestiforme, en la cuenca alta del río Capivara, en Botucatu (SP). Para ello se elaboraron mapas de talud, disección vertical, disección horizontal y energía de relieve, mostrando sectores naturalmente susceptibles a la ocurrencia de procesos erosivos, que aún se ven afectados por el uso inadecuado del suelo. Se concluye que la cartografía morfométrica, al brindar información para el uso del suelo a realizar considerando las limitaciones que imponen las características naturales del relieve, puede colaborar con la comprensión de la dinámica del paisaje y, por tanto, ser utilizada como instrumento para el manejo de espacios ocupados.

PALABRAS CLAVE: Processos Erosivos, Energia do Relieve, Relieve de Cuesta, Planificación Ambiental.

The morphometric cartography of relief as a subsidy to the study of the landscape: the upper Capivara River catchment – Botucatu (SP) – Brazil

ABSTRACT
Cartography has the potential to help identify areas that need to be protected, and may help in environmental planning. Therefore, the objective of this work was to identify naturally fragile sectors, with great potential for changing the geomorphological landscape in an area of cuestiform relief, in the upper basin of the Capivara river, in Botucatu (SP). For this, maps of slope, vertical dissection, horizontal dissection and relief energy were prepared, showing sectors naturally susceptible to the occurrence of erosion processes, which are still affected by inadequate land use. It is concluded that morphometric cartography, by providing information for land use to be carried out considering the limitations imposed by the natural characteristics of the relief, can collaborate with the understanding of the dynamics of the landscape and, therefore, be used as an instrument for managing spaces busy.

KEYWORDS: Erosive Processes, Relief Energy, Relief of Cuestas, Environmental Planning.

La cartographie morphométrique du relief comme aide à l'étude du paysage: le bassin supérieur du fleuve Capivara – Botucatu (SP) – Brésil

RESUMÉ
L'analyse morphométrique du relief vise à quantifier les caractéristiques naturelles de cet élément paysager qui peuvent entraver l'occupation du sol en raison de l'intense dynamique géomorphologique. Ainsi, la cartographie morphométrique a le potentiel d'aider à identifier les zones qui doivent être protégées et peut aider à la planification environnementale. Par conséquent, l'objectif de ce travail était d'identifier les secteurs naturellement fragiles, avec un grand potentiel de changement du paysage géomorphologique dans une zone de relief cuestiforme, dans le bassin supérieur de la rivière Capivara, à Botucatu (SP). Pour cela, des cartes de pente, de dissection verticale, de dissection horizontale et d'énergie du relief ont été préparées, montrant les secteurs naturellement sensibles à l'apparition de processus d'érosion, qui sont encore affectés par une utilisation inadéquate des terres. Il est conclu que la cartographie morphométrique, en fournissant des informations sur l'utilisation des terres à effectuer compte tenu des limitations imposées par les caractéristiques naturelles du relief, peut collaborer à la compréhension de la dynamique du paysage et, par conséquent, être utilisée comme un instrument pour gestion des espaces occupés.

MOTS-CLÉ: Processus Érosifs, Énergie de Secours, Allègement des Coûts, Planification Environnementale.

La cartografia morfometrica del rilievo come sussidio allo studio del paesaggio: il bacino superiore del fiume Capivara – Botucatu (SP) – Brasile

SOMMARIO
L'analisi morfometrica del rilievo mira a quantificare le caratteristiche naturali di questo elemento paesaggistico che può ostacolare l'uso del suolo a causa delle intense dinamiche geomorfologiche. Pertanto, la cartografia morfometrica ha il potenziale per aiutare a identificare le aree che devono essere protette e può aiutare nella pianificazione ambientale. Pertanto, l'obiettivo di questo lavoro è stato quello di identificare settori naturalmente fragili, con un grande potenziale di modifica del paesaggio geomorfologico in un'area di rilievo cuestiforme, nel bacino superiore del fiume Capivara, a Botucatu (SP). Per questo sono state predisposte mappe di pendenza, dissezione verticale, dissezione orizzontale ed energia di rilievo, che mostrano i settori naturalmente suscettibili all'insorgenza di processi erosivi, che risentono ancora di un uso inadeguato del suolo. Si conclude che la cartografia morfometrica, fornendo informazioni per l'uso del suolo da effettuare tenendo conto dei limiti imposti dalle caratteristiche naturali del rilievo, può collaborare alla comprensione delle dinamiche del paesaggio e, quindi, essere utilizzata come strumento per gestione spazi occupati.

PAROLE CHIAVE: Processi Erosivi, Energia di Sollievo, Sgravio dei Costi, Pianificazione Ambientale.

Introdução

A intensificação dos processos erosivos no município de Botucatu, relatado por alguns trabalhos 1, 2, 3, 4, alertam para a falta de planejamento ambiental na região, que necessita de trabalhos detalhados que auxiliem no estabelecimento do uso adequado da terra nestas localidades. Alterações no uso da terra e o aumento da capacidade técnica humana estão correlacionadas ao rompimento no estado de equilíbrio natural, que pode gerar e intensificar processos erosivos, resultando em alterações significativas na paisagem5.

A paisagem, como categoria de análise na geografia, é produto da interação no espaço geográfico do meio natural com o uso antrópico, quando existente. Desta forma, a paisagem pode ser munida de elementos da natureza e elementos sociais, culturais e econômicos6. Ainda, a paisagem pode ser interpretada de diferentes maneiras, de acordo com os conhecimentos de cada indivíduo e da sociedade. Desta maneira, a paisagem é alterada com o passar do tempo, e é condicionada tanto pelas características naturais, como pela capacidade técnica e de conhecimento da sociedade7.

A ausência de um planejamento adequado do uso da terra contribui para uma ocupação desenfreada do meio natural, podendo acelerar os processos erosivos em locais naturalmente suscetíveis, alterando negativamente a paisagem8. Conforme alguns autores destacam9, a cartografia morfométrica auxilia no planejamento ambiental e no uso e ocupação da terra, ao quantificar os elementos naturais do relevo e evidenciar setores com potencial fragilidade natural. Desta maneira, o objetivo deste trabalho foi de identificar setores naturalmente frágeis devido ás características do relevo, com grande potencial de alteração da paisagem geomorfológica em área de relevo cuestiforme, na alta bacia do Rio Capivara, no município de Botucatu (SP) (Figura 1).

Figura 1. Localização da área de estudo

Fonte: Elaboração Autores.

Metodologia

Para a realização da análise morfométrica do relevo, foram elaboradas as cartas de dissecação vertical, dissecação horizontal, declividade e de energia, utilizando o software ArcGIS em sua versão 10.5. A base cartográfica, com as informações sobre os cursos hídricos e as curvas de nível com equidistância de 5m, foi obtida a partir das cartas topográficas do IGC, em escala 1:10.000, disponíveis na plataforma online DATAGEO.

Carta de dissecação vertical

Utilizando a proposta original desenvolvida em 198110 e a adaptação proposta em 199111, foi elaborada a carta de dissecação vertical. Calculando, a partir das curvas de nível contidas em cada sub-bacia, a distância altimétrica entre o fundo de vale e a linha de cumeada, torna-se possível a delimitação de setores com maior ou menor grau de dissecação vertical12, 13.

Considerando a proposta original14, foram definidas 6 classes correspondentes aos desníveis altimétricos (Quadro 1), visando destacar a intensidade da dissecação vertical em cada sub-bacia. Cada classe abarca a equidistância de duas curvas de nível, representando 10 metros de desnível altimétrico, com exceção da classe 6, que contempla qualquer valor igual ou superior a 50m e que por isso pode abarcar mais de duas curvas de nível. Após a criação dos respectivos polígonos de cada classe em uma pasta, no ArcGIS. Para definir as classes de cada ponto, foi utilizada a régua disponível no Software, que permitiu a partir da medição da distância entre o fundo de vale e o talvegue a separação das classes. Após a separação consolidada, traçou-se os polígonos de cada classe usando o modo editor, através da ferramenta edit -> trace.

Quadro 1. Classes e valores estabelecidos para a carta de dissecação vertical

Classes

Divisão em metros

1

≤10m

2

10-20m

3

20-30m

4

30-40m

5

40-50m

6

≥50m

Fonte: Elaboração Autores.

Carta de dissecação horizontal

Para a confecção da carta de dissecação horizontal foi considerada a proposta metodológica original15 e a adaptação16. A dissecação horizontal avalia a distância em linha reta entre o fundo de vale e a linha de cumeada de cada sub-bacia, sendo sua relação de grandeza inversamente proporcional, pois quanto menor a distância entre esses elementos, maior será a dissecação horizontal.

Desta maneira, a carta proporciona a identificação de áreas com maior concentração de cursos hídricos e de confluências, possibilitando apontar os setores com maior potencial de atuação dos cursos fluviais na alteração da paisagem.

A partir da proposta original17, foram definidas 7 classes para a carta, considerando o valor mínimo mapeável de acordo com a escala empregada (1mm=10 metros) e dobrando o valor do limite das classes em sequência (Quadro 2). Pelo ArcGIS, a área de estudo foi inicialmente dividida em sub-bacias, que a partir do uso do recurso da régua no software, permitiu o cálculo da distância em linha reta do fundo de vale ao divisor de águas, podendo estabelecer os limites das classes vigentes.

Quadro 2. Classes e valores estabelecidos para a carta de dissecação horizontal

Classes

Divisão em metros

1

≤10m

2

11-20m

3

21-40m

4

41-80m

5

81-160m

6

161-320m

7

≥321m

Fonte: Elaboração Autores.

Carta de declividade

Para a elaboração da carta de declividade, foi considerada a proposta metodológica mais adequada para a área de trabalho18. A carta de declividade é uma importante ferramenta de análise do relevo, pois, identifica áreas que apresentam inclinação elevada, evidenciando uma potencial fragilidade natural na ocorrência de processos erosivos.

Com o uso do software ArcGIS através da ferramenta Slope, da extensão 3D Analyst tool, gerou-se automaticamente a carta de declividade. Porém, o procedimento automático gera distorções nos dados de declividade da bacia, especialmente nas áreas de topo, de fundo de vale e de canais pluviais. Para corrigir os erros identificados, criou-se um shapefile responsável por atribuir valor de altitude a estas localidades, mitigando tais erros.

Ainda, para a definição das classes da carta de declividade (Quadro 3), levando em consideração as características da bacia19.

Quadro 3. Definição e caracterização das classes de declividade

Classes de declividade e cores

Limites das classes de declividade em (°) e em (%)

Caracterização

Classe 1

≤ 1,27°

≤ 2%

Indica áreas planas e de possíveis alagamentos

Classe 2

1,28° -| 3,18°

3 % -| 5%

Áreas de intenso uso agrícola devido a facilidade de mecanização20.

Classe 3

3,19 -| 7,60°

6 % -| 12%

12% - Limite para o uso da mecanização na agricultura21, 22.

Classe 4

7,61° -| 18,50°

13% -| 30%

Devido a declividade, caracterizam-se como setores de pouco aproveitamento para o uso agrícola, ocorrendo ainda a intensificação da ocorrência de processos erosivos23.

Classe 5

18,51° -| 26,91°

31% -| 45%

Áreas íngremes de baixo uso agrícola devido à dificuldade de manejo24, 25.

Classe 6

26,92° - 90°

≥ 45%

 

Fonte: Elaboração Autores.

Carta de energia do relevo

Para o processo de elaboração da carta de energia do relevo, foi utilizada por base a proposta original26 e a adaptação para o meio digital27.

A carta de energia do relevo é produto da junção das demais cartas morfométricas (carta de dissecação vertical, dissecação horizontal e de declividade), evidenciando setores com maior potencialidade ao desenvolvimento de processos erosivos. Ainda, alguns autores destacam a carta como um indicador de áreas com potencial ao desenvolvimento de movimentos de massa28.

O processo de elaboração ocorreu por meio do ArcGIS, no qual as informações contidas em cada um dos arquivos raster das três cartas previamente elaboradas são unidas em um único, através da linguagem de programação Python. Desta forma, as classes das cartas anteriores são combinadas, gerando as classes de energia do relevo (Quadro 4).

Quadro 4. Combinação das classes para o estabelecimento da energia do relevo

Classes de energia do relevo

Declividade (%)

Combinação

Dissecação Horizontal (m)

Combinação

Dissecação Vertical (m)

Muito Forte

≥45%

Ou

≤10 m

-

-

Forte

31 – 45%

Ou

11 – 20m

Ou

≥50 m

Medianamente Forte

13 – 30%

Ou

21 – 40m

Ou

40 – 50m

Média

6 – 12%

Ou

41 – 80m

-

30 – 40m

81 – 160m

E

20 – 30m

Fraca

3 – 5%

Ou

161 – 320m

Ou

10 – 20m

Muito Fraca

≤2%

Ou

≥321 m

Ou

≤10 m

Fonte: Elaboração Autores.

Para a combinação e posterior definição das classes de energia, foram consideradas as características físicas do relevo da área de estudo29, 30. Desta forma, as classes foram definidas pelos seguintes termos:

Muito fraca -> Abrange os terrenos com a menor classe de declividade, de dissecação vertical e horizontal;

Fraca -> Destaca os terrenos com pouco declive ou de dissecação horizontal ou vertical ainda baixa;

Média ->Demarca os terrenos com declividades ainda apropriadas para a mecanização agrícola e por características intermediárias de dissecação horizontal e vertical;

Medianamente forte -> Representa terrenos onde a declividade representa uma barreira ao estabelecimento da mecanização agrícola, indicando ainda áreas de potencial avanço de processos morfogenéticos, indicadas pela intensificação das classes de dissecação vertical ou horizontal;

Forte -> Indicam terrenos onde a declividade é bem elevada, com dissecação horizontal elevada e dissecação vertical em sua classe mais alta;

Muito Forte ->Declividades mais intensas, igual ou acima de ≥45%, com quase toda a sua totalidade de ocorrência nos setores do front cuestiforme. Ainda, a dissecação horizontal mais elevada indica uma maior probabilidade de desenvolvimento de processos erosivos, em setores próximos à confluência de canais.

Ainda, para a classe muito forte de energia do relevo, não foram considerados os dados da dissecação vertical, uma vez que ocorre uma alta dissecação vertical em áreas de topos suaves e planos31, 32.

Resultados e Discussão

As cartas morfométricas evidenciam os setores onde as características naturais do terreno indicam propensão ao surgimento e intensificação de processos denudativos, incluindo a erosão linear.

De início, a carta de declividade (Figura 2), destaca os maiores declives encontrados no setor cuestiforme e nas áreas com a presença de morros testemunhos. Nestas localidades, ocorrem a predominância das classes de 31 - 45% e com mais de 45% de declividade.

Figura 2. Carta de declividade da área de estudo

Fonte: Elaboração Autores.

De forma geral, considerando a totalidade dos terrenos da bacia, pode-se notar o domínio das classes intermediárias de declive, com destaque para as áreas da Depressão Periférica e do reverso do

relevo cuestiforme, que apresentam declividade entre 6 -12% e de 13 - 30%, com poucas exceções para áreas de fundos de vale e de vertentes, apresentando classes de maior intensidade.

Conforme evidenciam alguns trabalhos33, 34, os setores com declividade de até 12% se caracterizam como passíveis para o emprego da mecanização agrícola no cenário tecnológico dominante no Brasil. No entanto, em trabalhos de campo (Figura 3) na área de estudo, foi identificado uso agrícola em setores com mais de 12% de declividade, incluindo as classes 13-30%, 31-45% e maior de 45%.

Figura 3. Depressão Periférica em primeiro plano, destacando o cultivo de silvicultura contornando uma feição erosiva

Fonte: Autores.

Para a classe 13 – 30%, em um trabalho em área similar35, em área de contato entre o relevo cuestiforme e a Depressão Periférica, uma intensificação drástica da ocorrência de processos erosivos, reforçando a baixa aptidão agrícola destes setores, considerando ainda a dificuldade de locomoção de maquinários nestas localidades.

Já as localidades que apresentam declividade nas classes de 31 -45% e maior que 45%, são caracterizadas como áreas restritas ao emprego da agricultura, uma vez que a declividade se torna muito acentuada, com o solo geralmente muito raso36, 37. Ainda, segundo a Lei Federal n° 12.651, considera-se área de preservação permanente as áreas que contemplem encostas com declividade superior a 45° (100%) e as bordas de tabuleiros. Estas restrições contemplam as áreas do relevo cuestiforme.

Desta maneira, a análise da carta de declividade, em conjunto com os levantamentos de campo, aponta para a necessidade de ajustar o uso da terra a declividade identificada em cada setor, reforçando a necessidade da análise destes setores a partir dos princípios da paisagem, considerando a interação dos aspectos da natureza e a ação do homem. Quando se ignora a declividade para a definição dos padrões de uso da terra, desequilíbrios naturais são potencializados, gerando e intensificando os processos erosivos. Na área de estudo, no front cuestiforme, constatou-se a ausência em muitos setores da mata nativa, apresentando o uso para a pastagem, gerando feições denudativas, como pode ser observado na figura 4.

Figura 4. Em segundo plano, cicatriz de deslizamento em área de pastagem no front cuestiforme

Fonte: Autores.

A partir da análise da carta de dissecação vertical (Figura 5), constata-se que esta característica morfométrica apresenta grande influência no setor cuestiforme. Considerando o grande desnível altimétrico presente entre os cursos hídricos e a cuesta, proporcionado pelo entalhamento dos canais, estas localidades, incluindo os morros testemunhos, se apresentam majoritariamente com a classe mais intensa de dissecação vertical (>50m), ressaltando a grande variação altimétrica destes terrenos (Figura 6).

Figura 5. Carta de dissecação vertical da área de estudo

Fonte: Elaboração Autores.

Figura 6. Setor com maior dissecação vertical da bacia, abarcando parte do relevo cuestiforme e dos morros testemunhos

Fonte: Autores.

Ainda, destacam-se as classes mais elevadas de dissecação vertical também nos divisores de águas presentes no setor da Depressão Periférica. Nos demais, por apresentar um bom número de nascentes, as menores sub-bacias presentes no setor da Depressão Periférica apresentam baixa ou moderada dissecação vertical.

Pela análise da carta de dissecação horizontal (Figura 7), destacam-se os setores de confluência dos cursos fluviais, principalmente nas áreas da Depressão Periférica. Desta forma, a região do relevo cuestiforme se apresenta como um importante divisor de bacias, com poucas confluências e, portanto, o domínio das classes mais baixas de dissecação horizontal.

Figura 7. Carta de dissecação horizontal da área de estudo

Fonte: Elaboração Autores.

Alem do setor cuestiforme com baixa dissecação horizontal, as áreas mais elevadas e de topo na Depressão Periférica também apresentam baixa dissecação horizontal. Com isso, o destaque permanece para o setor central da Depressão Periférica (Figura 7), concentrando o maior número de nascentes e de confluências de cursos fluviais, indicando ser o setor com maior potencial de atuação da dinâmica erosiva fluvial. A Figura 8 ilustra a presença de cursos fluviais no setor da Depressão Periférica da bacia.

Figura 8. Curso fluvial e topografia típica da Depressão Periférica em primeiro plano; em segundo plano, o relevo de cuesta

Fonte: Autores.

A carta de energia do relevo (Figura 9) aponta as áreas com maior probabilidade de ocorrência de processos erosivos, que merecem maior atenção38. Na área de estudo, alguns setores de topo na Depressão Periférica e o relevo cuestiforme em quase toda a sua totalidade, incluindo os morros testemunhos, enquadram-se nas classes forte e muito forte de energia do relevo.

Figura 9. Carta de energia do relevo da área de estudo

Fonte: Elaboração Autores.

Os setores de média e de baixa vertente na Depressão Periférica frequentemente apresentam as classes medianamente forte e média, com setores próximos aos cursos hídricos dominados pelas classes mais fracas de energia do relevo.

Embora alguns trabalhos destaquem os setores com as classes mais intensas de energia como suscetíveis à denudação, evidencia-se que tais localidades mais elevadas funcionam também como setores de acúmulo e de posterior dissipação de energia, com o processo ocorrendo a partir do topo para as áreas mais baixas das vertentes, em uma relação de vizinhança bastante complexa em setores de relevo cuestiforme39.

Alguns trabalhos demonstram que a maior quantidade de processos erosivos ocorre em setores de média e de baixa vertente, potencializado por fatores como o uso agrícola, gerando ausência de vegetação nativa, alterando o equilíbrio natural da vertente, além da presença de material pedológico mais profundo que é suscetível ao aprofundamento dos processos erosivos40, 41. Nas áreas mais altas, com elevada energia do relevo, o solo se apresenta muito raso, tornando a presença de feições erosivas menos frequente. Estas características foram constatadas em campo, onde se notou grandes sistemas erosivos em áreas de média e de baixa vertente, em setor da Depressão Periférica (Figura 10). Portanto, a análise da energia do relevo, assim como de outros parâmetros morfométricos, deve se fundamentar também nas relações de vizinhança, princípio geográfico já amplamente contemplado na análise da paisagem. Além disso, esses aspectos naturais do relevo interagem com padrões de uso da terra, gerando assim a necessidade desse tipo de mapeamento ser avaliado a partir da interação homem-natureza, princípio também presente nos estudos que se fundamentam na análise da paisagem.

Figura 10. Recorte da Depressão Periférica com a presença de feições erosivas expressivas localizadas em média e baixa vertente, em primeiro e segundo plano

Fonte: Autores.

Conclusões

As cartas morfométricas fornecem dados que permitem visualizar a característica geométrica do relevo de cada setor, aferindo o potencial natural a ocorrência de processos denudativos. Como destacado, principalmente pelas cartas de declividade e de energia do relevo, a bacia possui setores com elevado potencial ao desenvolvimento de processos erosivos e, portanto, de alteração da paisagem, podendo ainda sofrer maior dinamismo de tais processos em função da ação antrópica. Assim, considera-se que paisagens, como a estudada (Figuras 8 e 6), marcadas por grandes degraus topográficos, que criam limitações ao uso da terra, assim como energia ao escoamento de superfície e fluvial, caracterizando uma dinâmica natural diferenciada, necessitam de dados sobre a morfometria do relevo, os quais permitem identificar os setores naturalmente propensos a maior dinâmica geomorfológica.

Com isso, a cartografia morfométrica, analisada a partir da categoria de análise da paisagem, contribui para o planejamento ambiental, podendo fornecer informação para que o uso da terra seja realizado considerando as limitações impostas pelas características naturais do relevo.

Agradecimentos

Os autores agradecem a Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP) pelo financiamento deste trabalho.

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