Miscelánea

water and landscape
AGUA y TERRITORIO

Um encontro entre Potter e Boaventura nas margens do Rio Belém: o que ainda precisa ser dito sobre a universalização do acesso à água potável?

A meeting between Potter and Boaventura on the banks of the Belém River: what still needs to be said about universal access to drinking water?

Marta Luciane Fischer

Pontifícia Universidade Católica do Paraná
Curitiba, Paraná, Brasil
marta.fischer@pucpr.br

ORCID: 0000-0002-1885-0535

Caroline Filla Rosaneli

Pontifícia Universidade Católica do Paraná
Curitiba, Paraná, Brasil
caroline.rosaneli@gmail.com

ORCID: 0000-0003-3710-5829

Información del artículo

Recibido: 6/04/2023
Revisado: 1/11/2023
Aceptado: 21/11/2023

ISSN 2340-8472

ISSNe 2340-7743

DOI 10.17561/at.24.7875

CC-BY

© Universidad de Jaén (España).
Seminario Permanente Agua, Territorio y Medio Ambiente (CSIC)

RESUMO
Neste ensaio crítico, teórico e reflexivo, questiona-se o que ainda precisa ser dito sobre o direito ao acesso à universalização da água potável, promovendo-se, em caráter inovador, o encontro das perspectivas teóricas de Van Rensselaer Potter, bioquímico estadunidense e expoente da bioética, e Boaventura de Sousa Santos, sociólogo português que cunhou o termo Epistemologias do Sul. A reflexão se desenvolveu a partir de uma cena cotidiana na Vila das Torres, em um trecho urbano do rio Belém, Curitiba, sul do Brasil, cujas vulnerabilidades ambientais e sociais extrapolam os limites geográficos e temporais. Subsidiado pela convergência dos conhecimentos científicos, tecnológicos e tradicionais que buscam proteger a natureza, a cultura, a dignidade e a esperança de todos os seres vivos que compõem os ecossistemas urbanos, os dados sustentam a perspectiva da Bioética Ambiental como alternativa para esse encontro, uma vez que visa atender às expectativas multidisciplinares de Potter e de Boaventura.

PALAVRAS-CHAVE: Bioética Ambiental, Natureza, Rio Urbano, Direito à Água, Direitos Humanos.

ABSTRACT
This critical, theoretical and reflective essay questions what still needs to be said about the right to access to universal drinking water. It promotes, in an innovative way, the meeting of the theoretical perspectives of Van Rensselaer Potter, an American biochemist and exponent of bioethics, and Boaventura de Sousa Santos, a Portuguese sociologist who coined the term Epistemologies of the South. The reflection developed from an everyday scene in Vila das Torres, in an urban stretch of the Belém River, Curitiba, southern Brazil, whose environmental and social vulnerabilities go beyond geographic and temporal limits. Supported by the convergence of scientific, technological and traditional knowledge that seeks to protect nature, culture, dignity and hope of all living beings that make up urban ecosystems, the data support the perspective of Environmental Bioethics as an alternative for this encounter, instead, it aims to meet the multidisciplinary expectations of Potter and Bonaventure.

KEYWORDS: Environmental Bioethics, Nature, Urban River, Right to Water, Human Rights.

Un encuentro entre Potter y Boaventura a orillas del río Belém: ¿qué queda por decir sobre el acceso universal al agua potable?

RESUMEN
Este ensayo crítico, teórico y reflexivo cuestiona lo que aún queda por decir sobre el derecho al acceso universal al agua potable. Promueve, de manera innovadora, el encuentro de las perspectivas teóricas de Van Rensselaer Potter, bioquímico estadounidense y exponente de la bioética, y Boaventura de Sousa Santos, sociólogo portugués que acuñó el término Epistemologías del Sur. Escena cotidiana en Vila das Torres, en un tramo urbano del río Belém, Curitiba, sur de Brasil, cuyas vulnerabilidades ambientales y sociales van más allá de los límites geográficos y temporales. Apoyados en la convergencia de conocimientos científicos, tecnológicos y tradicionales que buscan proteger la naturaleza, la cultura, la dignidad y la esperanza de todos los seres vivos que integran los ecosistemas urbanos, los datos sustentan la perspectiva de la Bioética Ambiental como una alternativa para este encuentro, en cambio, Su objetivo es satisfacer las expectativas multidisciplinarias de Potter y Buenaventura.

PALABRAS CLAVE: Bioética Ambiental, Naturaleza, Río Urbano, Derecho al Agua, Derechos Humanos.

Rencontre entre Potter et Bonaventure sur les rives du fleuve Belém : que reste-t-il à dire sur l'accès universel à l'eau potable ?

RÉSUMÉ
Cet essai critique, théorique et réflexif s'interroge sur ce qu'il reste à dire sur le droit à l'accès universel à l'eau potable. Il réunit les perspectives théoriques de Van Rensselaer Potter, biochimiste américain et défenseur de la bioéthique, et de Boaventura de Sousa Santos, sociologue portugais qui a inventé le terme d'épistémologies du Sud. La réflexion s'est développée à partir d'une scène quotidienne à Vila das Torres, un tronçon urbain de la rivière Belém à Curitiba, dans le sud du Brésil, dont vulnérabilités environnementales et sociales dépassent limites géographiques et temporelles. Soutenues par la convergence des connaissances scientifiques, technologiques et traditionnelles qui cherchent à protéger la nature, la culture, la dignité et l'espoir de tous les êtres vivants qui composent les écosystèmes urbains, les données soutiennent la perspective de la bioéthique environnementale en tant qu'alternative pour cette rencontre, car elle vise à répondre aux attentes multidisciplinaires de Potter et Bonaventura.

MOTS-CLÉ: Bioéthique Environnementale, Nature, Rivière Urbaine, Droit à l'Eau, Droits de l'Homme.

Un incontro tra Potter e Bonaventura sulle rive del fiume Belém: cosa c'è ancora da dire sull'accesso universale all'acqua potabile?

SOMMARIO
Questo saggio critico, teorico e riflessivo si interroga su ciò che ancora deve essere detto sul diritto all'accesso universale all'acqua potabile. Riunisce le prospettive teoriche di Van Rensselaer Potter, biochimico americano ed esponente della bioetica, e di Boaventura de Sousa Santos, sociologo portoghese che ha coniato il termine Epistemologie del Sud. La riflessione si è sviluppata a partire da una scena quotidiana a Vila das Torres, un tratto urbano del fiume Belém a Curitiba, nel sud del Brasile, le cui vulnerabilità ambientali e sociali vanno oltre i limiti geografici e temporali. Sostenuti dalla convergenza di saperi scientifici, tecnologici e tradizionali che cercano di proteggere la natura, la cultura, la dignità e la speranza di tutti gli esseri viventi che compongono gli ecosistemi urbani, i dati sostengono la prospettiva della Bioetica Ambientale come alternativa per questo incontro, poiché mira a soddisfare le aspettative multidisciplinari di Potter e Bonaventura.

PAROLE CHIAVE: Bioetica Ambientale, Natura, Fiume Urbano, Diritto all'Acqua, Diritti Umani.

Introdução

O presente ensaio crítico nasceu de um breve instante de conexão, em um momento distinto ao longo do ano de 2022, com uma cena de lazer de uma comunidade em situação de vulnerabilidade. O marco de uma nova fase que se instalou no mundo pós-pandêmico, cuja população isolada pelo enfrentamento da crise sanitária, se deparou com a oportunidade de confraternizar em um espaço comunitário às margens de um rio poluído. Uma cena que extrapola os limites geográficos e temporais, se repetindo cotidianamente, em diferentes partes do planeta, invisibilizada pela naturalidade da destruição cometida contra a natureza, a cultura, a dignidade e a esperança. A inquietação diante da incipiência de medidas preventivas e de ações efetivas na mitigação e na superação de cenas como, essa conduziu à reflexão sobre o que todavia falta ser falado sobre o direito ao acesso à água potável.

A reflexão foi construída a partir da ligação com um trecho de um rio onde se desenvolveu a maior comunidade da cidade de Curitiba, estado do Paraná, sul do Brasil, a Vila das Torres (Figura 1). Com o mais baixo índice de desenvolvimento humano municipal de 0,6231, se constitui de uma invasão irregular iniciada há 66 anos em uma área de 199,4 mil m2 pertencentes a diversos proprietários. Dados do censo do ano 20002 já indicavam uma congregação de 4.231 moradores com renda mensal de 2,2 a 3,1 salários-mínimos, distribuídos em 1.028 domicílios, sendo que cerca de 673 já eram dotados de título de propriedade. Com a denominação atual de Unidade de Desenvolvimento Humano (UDH) está localizada a 2 km da área central da cidade, superando o título de ‘favela’ em 1995, sendo a partir de então provida com redes de água, coleta e tratamento de esgoto, energia elétrica, drenagem e pavimentação de ruas. Segundo Requião et al.3, encontros cotidianos entre os moradores fortalecem o sentimento de pertencimento que transformam a identidade e a memória coletiva. Um levantamento da percepção socioambiental da comunidade foi realizado por Santos4 alertando para o clamor pelo seu direito, especialmente de fala, na busca de ações e soluções coletivas em colaboração com o poder público. Cidadãos que percorrem vias importantes da cidade reconhecem o estado de vulnerabilidade de pessoas que não entram nas estatísticas oficiais de acesso aos serviços hídricos, e de que há muito que ser feito pela justiça social de moradores de uma cidade que detém o título de ecológica e sustentável5.

Figura 1. Mapa de Localização da área de estudo: a) Brasil, b) Paraná, c) Curitiba, d) Vila das Torres

Fonte: Mapa adaptado Google Maps com desenhos das autoras. Fotos: Autora, 2023.

O cenário em questão ocorre às margens de um importante rio urbano de Curitiba: o rio Belém, cuja nascente localiza-se no bairro Cachoeira, norte da cidade e a foz nas cavas do rio Iguaçu, no bairro Boqueirão, sul da cidade. Com 21 km de extensão e 88 km2, perpassa por 36 dos 75 bairros do município, cujo leito abriga ciclovias, ruas, praças, indústrias, casas e ocupações irregulares, sendo que na região central ele corre em galerias subterrâneas. Embora a cidade tenha se desenvolvido em suas margens usufruindo do acesso à água potável, os processos antrópicos, como a poluição por esgotos clandestinos, os poluentes orgânicos e químicos das indústrias e das residências, a propagação de doenças e de pragas urbanas, a destruição da mata ciliar, a erosão, o assoreamento, a canalização, a impermeabilização enfim, tudo isso faz com que não seja reconhecido pelos curitibanos como um elemento natural da sua paisagem6. Os tradicionais transbordamentos estimularam as primeiras grandes obras de saneamento da cidade7. Contudo, embora a revitalização do referido rio —que, pode-se afirmar, é o mais poluído e maltratado ao longo de 20 km— seja uma reivindicação social, aparentemente não se constitui em uma preocupação da gestão pública e de organizações não governamentais, pois o que é presenciado é um rio que exala um cheiro forte, um odor desagradável, que ameaça a saúde física, mental, espiritual, social e ambiental de toda sua população.

A cena observada para esse diálogo ocorreu em um pequeno trecho da margem do rio Belém, teoricamente revitalizado8 e assistido pelo projeto “Amigos do Rio”, lançado em 2019, e que de acordo com a prefeitura9, foi responsável pela despoluição e limpeza dos rios de Curitiba, impactando mais de 27,4 mil pessoas por meio de 200 ações de educação ambiental em condomínios, em associações, em igrejas e em centros comunitários. O espaço, contando com o plantio de mudas de árvores nativas e flores, com grama aparada, com brinquedos infantis e bancos, conclama os moradores para usufruírem momentos de lazer e de confraternização às margens do rio, materializando a imaginação de pintores clássicos como Georges Seurat em sua obra “Tarde de Domingo no Parque na Ilha de Grande Jatte”10. No entanto, por um detalhe importante não é possível perceber a mesma integridade: o rio que corria a encher os sentidos de seus convidados, estava morto, em suas águas móveis, lixo e esgoto, e nas árvores de sua margem repousavam roupas, provavelmente fruto de doações que não encontraram conexões, aumentando ainda mais o clima de invisibilização e descaso. Contudo, o mais chocante foi justamente a normalidade da situação aos alhos da comunidade, que usufrui dos ‘benefícios’, e da sociedade e dos gestores que se satisfazem por suas doações.

Em um flash temporal, ao cruzar uma via que corta a comunidade para dar acesso a rodovias estaduais e federais, foi transposto para um momento do tempo e do espaço duas figuras importantes: Van Rensselaer Potter, bioquímico estadunidense e expoente da Bioética Ambiental11 e Boaventura de Sousa Santos, o jurista português que cunhou o termo Epistemologias do Sul12. Então, em um exercício mental reflexivo, projetou-se como seria o encontro desses dois importantes pesquisadores; um da área biomédica, que conclamava pela conexão das ciências humanas, e o outro das humanidades, que conclamava a conexão com a natureza.

Questionando-se o que ainda é necessário ser dito a respeito do direito ao acesso à universalização da água potável, no presente ensaio crítico, de cunho teórico e reflexivo, promove-se, em caráter inovador, o encontro das perspectivas teóricas de Potter e Boaventura, na interpretação de um cotidiano de muitas cidades: um rio poluído que corta a cidade, gerando vulnerabilidades inaceitáveis, contudo toleráveis, normalizadas e invisibilizadas. Assim, objetivou-se, por meio de uma revisão bibliográfica como da caracterização da gestão dos serviços hídricos na realidade brasileira promover uma confluência com os pressupostos da Bioética Ambiental na reflexão de soluções que congreguem as perspectivas éticas de Potter e Boaventura, refletir sobre o papel da Bioética Ambiental na promoção do acesso universal à água potável.

O recorte desta pesquisa parte da cidade de Curitiba, reconhecida nacional e internacionalmente pelo investimento em sustentabilidade, referida como capital ecológica do Brasil por prover mais de 60m2 de área verde por habitante, um valor cinco vezes maior do que aquele recomendado pela Organização Mundial da Saúde13. Acresce-se o posicionamento do município no ranking nacional de saneamento que registra 100% de atendimento da população quanto ao acesso à água encanada, e quase 100% de tratamento de esgoto14. Contudo, a infraestrutura provida para seus cidadãos não foi suficiente para evitar o enfrentamento de uma crise hídrica, concomitante às medidas de contenção da pandemia Covid-19 entre os anos de 2020-202115. As limitações impostas às medidas básicas de higienização e as desigualdades no acesso e no armazenamento de água revelaram vulnerabilidades inviabilizadas16. Assim, partindo da dissonância identificada entre a idealização e a realidade foi proposto o delineamento metodológico da presente pesquisa, o resgate de dados empíricos registrados para realidade brasileira, como representante dos países do Sul, a fim de subsidiar a identificação dos limitantes para o atendimento ao direito básico universal de acesso à água potável. O presente ensaio não se propõe a aprofundar a situação específica da comunidade da Vila das Torres ou do rio Belém, nem tão pouco esgotar a temática da crise hídrica, mas sim refletir a respeito dos limitantes éticos na tomada de soluções efetivas, especialmente em países do Sul, que mesmo assistido por legislações e políticas públicas, toleram situações inaceitáveis que comprometem o mínimo necessário para existência digna de pessoas e dos demais seres vivos.

A Bioética das águas

A perspectiva bioética do acesso à água potável se estabelece com as reflexões do cientista Van Rensselaer Potter17. Os Estados Unidos representam o recorte geográfico e o espaço temporal o ano de 1971, momento em que a economia capitalista norte-americana se fortalece no pós-guerras. Embora Potter tenha percorrido a sua vida acadêmica desenvolvendo estudos experimentais na área da oncologia, entrou em contato com ideias emergentes da ecologia, sustentabilidade e educação ambiental, transpondo sua área de atuação em pesquisa de bancada, estabelecendo uma analogia entre os efeitos das células cancerígenas com o impacto dos seres humanos no planeta Terra18. Potter foi um dos pioneiros no emprego do neologismo Bioética e, embora a área do saber tenha se fortalecido no segmento da ética médica, sua preocupação inicial era com a sobrevivência planetária. Para Potter19, o desenvolvimento tecnológico e científico estava ocorrendo numa velocidade extraordinária e incompatível com a capacidade da sociedade de resolver os conflitos que acompanhavam as inovações, que a priori intencionava melhorar a vida de todos.

Potter20 entendia que a dissociação entre as ciências biomédicas e as ciências humanas era um fator decisivo, pois as decisões dos limites de exploração dos recursos naturais e da geração de vulnerabilidades, demandavam de balizadores éticos e humanitários. A bioética na perspectiva de Potter21 foi idealizada, então, como a figura de uma ponte que uniria os argumentos científicos, sociais e éticos por meio de um diálogo multidisciplinar entre agentes morais, pacientes morais e vulneráveis. A deliberação se constitui, assim, de um processo apropriado pela bioética, pleiteando uma escuta acolhedora, resultante em uma confluência de valores e princípios éticos e a tomada de solução coletiva e benéfica para todos os atores envolvidos direta ou indiretamente com a questão.

Na obra Bioética Global22, Potter ampliou a perspectiva ecológica da bioética ao prever catastróficos cenários ambientais com o aumento da população mundial, com a exploração predatória dos recursos naturais, com o aumento da poluição, com as mudanças climáticas e com o domínio do sistema capitalista. Em relação aos recursos hídricos, apontou a negligência para com as futuras reservas de águas. Potter23 alertou para o esgotamento e para a degradação das reservas hídricas por contaminação com resíduos tóxicos, originários principalmente da agricultura. Enquanto muitas cidades captavam água para uso doméstico, industrial e na agricultura por meio de desvios de cursos d’água em represas, outras estavam exercendo a mineração e bombeando água de aquíferos subterrâneos. Nesse contexto, a quantidade de água extraída excedia a reposição natural pelas chuvas. A prática, aprimorada com a invenção da bomba centrífuga, após a Primeira Guerra Mundial, para o uso da água represada ou extraída, sempre esteve atrelada a uma questão ética importante: as decisões devem ser balizadas pelos interesses e necessidades presentes ou futuros?24. A reflexão apresentada por Potter25 quanto à proeminência de interesses econômicos aos valores humanos na exploração da água ocorreu na década de 1980, momento em que cientistas já apontavam há pelo menos duas décadas o desaparecimento paulatino de lençóis freáticos.

Dados de contaminação dos lençóis freáticos colocaram os ambientalistas do final do século XX apreensivos com o risco de diminuir drasticamente a disponibilidade de água potável no planeta. Os aquíferos estavam vulneráveis aos processos antrópicos como aterros sanitários, mineração, exploração de gás e petróleo, injeção de resíduos em poços, agrotóxicos e fertilizantes, confinamento de gado, sais para degelos, esgotos com vazamento, derreamentos e invasão de água salobra. Potter concluiu: “O dilema do dólar é evidente em toda parte: o conflito entre o ganho presente e saúde futura é claramente um problema bioético cuja solução requer acesso a conhecimento biológico”. Concomitante ao óbvio impacto ambiental, Potter ressaltou os impactos na saúde humana, a tolice em se acreditar que a população humana poderia evoluir para uma adaptação fisiológica ou, ainda, que os avanços médicos seriam suficientes para mitigar os problemas advindos com as atitudes irresponsáveis. Em um momento histórico em que a globalização não era uma realidade, o bioeticista alertou para o impacto ambiental além das fronteiras geográficas, tomando como exemplo a chuva ácida26.

As ideias de Potter emergiram para reflexão da cena que subsidia esse ensaio crítico, uma vez que o cenário mundial vivenciado na atualidade é justamente fruto de um descaso aos seus alertas e recomendações da necessidade de inserir os pressupostos bioéticos nas decisões a respeito do uso da água. A bioética incorpora valores universais como mediadores de como usar e preservar um bem vital comum, porém, fica claro que se em uma cidade reconhecida como sustentável, tolera-se uma situação como a descrita, supõe-se que os valores em questão não envolvam a saúde, a dignidade ou a estética27.

As Epistemologias do Sul

A perspectiva sanitária do acesso à água potável é apoiada nas intervenções de Boaventura de Sousa Santos, um sociólogo português, com formação norte-americana justamente na época em que despontavam as ideias de Potter. Sua ampla produção acadêmica, sua militância e o diálogo com movimentos sociais de diferentes partes do mundo subsidiaram a reflexão sobre as desigualdades enfrentadas pelos países colonizados, balizados pelas ‘Epistemologias do Sul28’. Boaventura, assim como Potter, vislumbrava na interdisciplinaridade uma perspectiva de solução de problemas globais, consequentemente, agregava as reivindicações de Potter da perspectiva humana nas intervenções biomédicas, ao conclamar pela incorporação da natureza na área de atuação das ciências sociais. Boaventura trouxe uma reflexão altamente compatível com as soluções para os problemas levantados por Potter, intrínsecas as suas três ideias básicas: a) a interpretação do mundo transpõe a perspectiva ocidental; b) a justiça social não existe sem justiça cognitiva; e c) transformações emancipadoras demandam a valoração da diversidade.

Para Boaventura, o capitalismo global, o colonialismo e o patriarcado se transformam em inverdades institucionalizadas gerando, em proporção geométrica, a exclusão e a discriminação em todos os níveis: pessoal, coletivo e ambiental, demandando uma ruptura da epistemologia da cegueira e propondo uma “sociologia das ausências/emergências” e uma “ecologia dos saberes”. Assim, problemas modernos necessitam de soluções modernas, ou seja, na mesma medida da profundidade e da amplitude. Logo, deve congregar conhecimentos tecnológicos, científicos e culturais em vias de uma inovação social, uma vez que problemas graves precisam superar as respostas débeis disponibilizadas pela academia tradicional29, perspectiva que conduziu ao trânsito por questões como a fome e a sede, até o enfrentamento de pandemias e de mudanças climáticas30.

Os olhares alternativos que Boaventura lançou na luta pela igualdade, que é a principal pauta da agenda da bioética, disseminada desde as ideias primordiais de Potter, que acolhe a temática do acesso à água potável. Assim, a resistência aos processos globais de contra-hegenômicos; a defesa dos direitos humanos; a ecologia dos saberes emancipatórios e libertários; a pedagogia do deslocamento da escuta amplia e interconecta os olhares das ciências da vida e das ciências sociais. Boaventura denominou suas propostas de “ferramentas conceituais” que buscam a justiça coletiva por meio do interconhecimento, da mediação e da celebração de alianças. Neste contexto se faz necessária a superação das contradições entre diferentes paradigmas, entre comunidades domésticas e cooperativas e entre o poder do conhecimento científico. Perspectivas, estas, condizentes com os pressupostos bioéticos, mesmo sem Boaventura ter aplicado o termo ou o conceito da Bioética.

Boaventura31 agregou às perspectivas multidisciplinares propostas por Potter32, ao intencionar romper com as dicotomias, cuja hierarquia subordinadora foi fortemente estabelecidas ao longo da história: sul/norte e oriente/ocidente, ditando os valores culturais, sociais e econômicos e transpassando de forma avassaladora sobre saberes e formas de viver, expropriando, suprimindo, silenciando, gerando desigualdades sociais ao repudiar a diversidade. Flausino e Gallardo33 imputaram à revitalização de rios urbanos o potencial de benefícios não tangíveis decorrentes de oferta de serviços ecossistêmicos culturais, uma vez que agregam valor à qualidade de vida, às interações pessoais, ao lazer, à contemplação e à identidade.

Considerando que um terço do planeta atualmente está desertificado ou comporta áreas construídas, um terço são florestas e um terco é destinado para agricultura, para Boaventura “os grandes problemas ambientais na dimensão espaço/tempo se agregam em três vetores: a) explosão demográfica; b) globalização econômica; e c) degradação ambiental”34, todos aspectos apontados por Potter como interconectados, o que potencializa o comprometimento da sobrevivência planetária. A explosão demográfica tem seu maior impacto em países periféricos, e como já previa Potter35, cuja desigualdade entre a população e os recursos naturais e sociais culminaria em cidades congestionadas, sem saneamento e sem serviços sociais mínimos, fome, desemprego, violência e colapso ecológico. Diante desse quadro, as emergências climáticas potencializam todas as formas de migração, em especial para os grandes centros, vistos como lugares promissores para uma vida digna que, na verdade, não é concretizada, tendo em vista a ocupação irregular e a falta de acesso aos serviços básicos36. Esta realidade é vivenciada na Vila das Torres e em tantas outras comunidades dos países do Sul.

A globalização econômica, intensificada nas últimas décadas, abre espaço para que empresas multinacionais imputem a cultura de exportação, voltando-se para o financiamento de grandes empreendimentos que visam usufruir de um menor controle legal e de elevada corrupção para explorarem ao máximo as commodities. Consequentemente, se incentiva o que é de interesse internacional, aumentando as desigualdades, alienando os processos e desincentivando o desenvolvimento de inovação e tecnologia37. A privatização do sistema de gestão dos serviços hídricos reflete modelos dos países do Norte, que encontram como empecilhos nos países do Sul um montante de população que não tem como arcar com esse custo, dependendo de programas assistencialistas38. Obviamente que o gestor público está mais hábil em prover a assistência ao cidadão, do que o gestor privado, ao consumidor39, por isso alguns países latinos como Equador, Bolívia e Colômbia, se posicionaram apoiados em perspectivas ecocêntricas, regulamentando a coparticipação dos cidadãos na adoção de medidas protetivas ao direito à água40.

Por fim, a degradação ambiental confluindo os efeitos do aumento da população e da globalização se consistiu em um problema transnacional. Dependendo de como as consequências serão enfrentadas poderá intensificar o conflito global entre Norte/Sul ou transpor o conflito por meio de uma plataforma de solidariedade global e intergeracional. Em decorrência da pressão das nações opressoras que se utilizam de técnicas obsoletas de exploração agrícola, industrial e de gestão urbana, promovendo a desertificação, salinização, erosão do solo, destruição de florestas, esgotamento da água potável, poluição e efeito estufa. No entanto, aparentemente o Norte não apoiou a perspectiva ambiental da bioética de Potter, assim como não tem se mostrado disposto a abandonar hábitos poluidores e tão pouco contribuir para mudança desses hábitos no Sul. Contudo, Boaventura desmistificou que a capacidade de poluição é a única arma que o Sul possui para confrontar o Norte.

A inacessibilidade à água potável é multifatorial41 e se constitui em um problema complexo, envolvendo diferentes atores em distintos cenários. No entanto, Boaventura identificou alternativas como, por exemplo, uma produção ecossocialista, agricultura orgânica e redes alternativas de proteção comunitária para o uso do solo sem degradar a natureza, sendo uma forma de atender às necessidades individuais sem comprometer as necessidades humanas presentes e futuras42. Boaventura ainda identificou na “ecologia dos saberes”, uma oposição à lógica da monocultura do conhecimento, uma forma de dominação, principalmente de países centrais, que detêm o acesso ao desenvolvimento de ciência e de tecnologia. Obviamente que o sociólogo não está negando a importância da ciência, mas conclamando para que se deem credibilidade para os conhecimentos não científicos, o que agrega a demanda de Potter de inserir valores éticos e morais nas decisões relativas ao desenvolvimento tecnocientífico.

A ciência moderna, na forma como se apresenta, incentiva ao pensamento abissal e sua soberania43. A diversidade agrega mais alternativas, destituindo, assim, o poder político de decisões de interesses comunitários. A própria crise ambiental tem ilustrado que alternativas locais perdem valor como soluções inovadoras se não forem compartilhadas. Indubitavelmente o mundo, para além da Vila das Torres, vive uma crise ambiental e as catastróficas previsões de Potter da década de 1970 já estão implementadas, logo, o caráter é de urgência e o mesmo autor reitera que não há mais tempo para alerta, é preciso mitigá-las ou pelo menos conter o seu avanço. A crise ecológica mundial tem impactado além das óbvias mudanças climáticas e da perda de biodiversidade, pois estão sendo perdidos saberes e conhecimentos tradicionais44. Miranda45 acredita que os estudos e a compreensão dos problemas ecológicos são limitados pela dificuldade que a sociedade enfrenta para confrontar os interesses econômicos e políticos. Enquanto Nunes e Louvison46 identificam o potencial da “ecologia dos saberes” na descolonização da saúde pública. Para Boaventura, a educação emancipatória não evita o conflito, mas o compreende como parte construtora das soluções, logo deve articular a justiça social e cognitiva desenvolvendo a autonomia crítica na atuação do cidadão de forma a se posicionar no mundo e na vida de uma maneira sustentável, por meio de uma Co presença radical47. Justamente o que conclamam os moradores da Vila das Torres48, assim como os cidadãos invisibilizados em muitas comunidades periféricas do Brasil e do Mundo.

As perspectivas de Boaventura demostram que a situação vivenciada atualmente —cena proposta na Vila das Torres para essa reflexão sobre o rio Belém— reflete processos consolidados em países colonizados e, infelizmente, não superados, que normatizam as desigualdades que limitam os direitos de cidadãos de usufruírem das necessidades básicas para qualidade de vida. A invisibilidade de seus valores vai além do não atendimento às suas necessidades, e é fruto do desconhecimento de seus interesses.

A Colonização e o acesso à água potável

A partir da confluência das perspectivas de Potter e Boaventura emerge o questionamento da peculiaridade das vulnerabilidades dos países colonizados à universalização do acesso à água potável. Para tal, apresentam-se alguns documentos e medidas sobre políticas públicas envolvidas na gestão das águas e seu potencial de sinergia com a Bioética e os Direitos humanos.

Inicialmente deve-se considerar que do montante de água presente no planeta Terra apenas 2,5% se constituem de água doce, sendo que 1% está acessível para o consumo em rios, nos lagos e no subsolo. Cerca de 72% da água utilizada é destinada para a agricultura, 12% para a indústria e 16% para o uso doméstico49. Porém, 1 bilhão de pessoas não têm acesso à água potável e 1,8 bilhão não tem acesso ao saneamento básico50. E, ainda, 10% da população (cerca de 17 milhões de pessoas) ainda usa o sistema clandestino e 5,4% têm apenas uma torneira em casa.

O Relatório Mundial sobre o Desenvolvimento da Água das Nações Unidas51, intitulado ’Valorização da Água’, aponta que cinco perspectivas estão inter-relacionadas na demanda atual de defesa dos direitos humanos e na “saciedade da água”: 1) a valorização das fontes hídricas, recursos hídricos in situ e ecossistemas; 2) valorização da infraestrutura hídrica para armazenamento, uso, reuso ou ampliação do abastecimento de água; 3) valorização dos serviços de água, principalmente água potável, saneamento e aspectos relacionados à saúde humana; 4) valorização da água como insumo para a produção e atividade socioeconômica, como alimentação e agricultura, energia e indústria, negócios e emprego; e 5) outros valores socioculturais da água, incluindo atributos recreativos, culturais e espirituais, experiências de diferentes regiões globais; oportunidades para reconciliar vários valores da água por meio de abordagens mais integradas e holísticas de governança e abordagens de financiamento. O documento subsidia a perspectiva de valoração utilitária e funcional da água corroborando que a insuficiência de água impacta para além dos atendimentos fisiológicos e higiênicos. Fischer e Rosaneli52 propuseram o conceito de “fome de água” ao imputar uma dimensão bioética a todas as faltas e excessos que matam corpos, mentes, espíritos, instituições e ecossistemas, demostrando que a sem acesso à falta de água, contempla uma dimensão que demanda de novos olhares. Importante reiterar a necessidade de respaldar o valor intrínseco da água e o direito à existência de sua natureza fluida, que conecta os organismos vivos e os elementos naturais, transpondo barreiras geográficas, políticas e temporais.

As políticas públicas de acesso à água potável e saneamento no Brasil alimentam um viés privatista confluente com o colonialismo. O impacto do pensamento colonial neste contexto advém de formas históricas de controle de trabalho, recursos e produtos que orbitam em torno do capitalismo e do mercado mundial53. O controle da água e sua apropriação como commodities têm como expectativa uma Guerra Global, cujo a raridade pode ser almejada pelo mercado, como forma de valorizar o seu valor na bolsa de valores. A privatização da água não é um evento recente, chegando ao ápice com a entrada na bolsa de Nova York, ampliando as desigualdades e, em consequência, produzindo mais inacessibilidade de pessoas a um bem vital. A América Latina apresentou as primeiras experiências com privatização da água em países em desenvolvimento, incentivadas principalmente pelo Banco Mundial, que direcionou financiamentos para gestão hidrológica, imputando a água como elemento de mercado, obviamente sujeito às leis internacionais de mercado, podem viabilizar os lucros54.

A gestão dos recursos hídricos, para Pontes e Schramm55, conclama por soluções coletivas que devem ser intermediadas pelo Estado, assumindo três papeis: a) atuação direta por instituições públicas; b) atuação direta por intuições públicas com direito privado, arcando com a responsabilidade executora e fiscalizadora; e c) atuação indireta, transferindo a responsabilidade executora para instituições privadas e mantendo apenas o papel fiscalizatório. Os autores alertaram que a limitação do controle privado em países com desigualdades sociais extremas advém da incerteza de garantir a universalidade de acesso aos recursos, uma vez que há a possibilidade de gerar conflito com a expectativa de obtenção de lucro. Instala-se, portanto, um cenário de insegurança hídrica, suprimindo o acesso a água como cidadania e a inserção do seu papel como mero consumidor. Devido aos entraves burocráticos para adotar intervenções compensatórias, o Estado não tem como garantir a justiça sanitária e Pontes e Schramm56 atentaram para a inoperância de um sistema privado em uma sociedade que agrega um relevante montante da sua população à margem do sistema de abastecimento, logo, isenta do acesso aos serviços oficiais, as pessoas acabam por utilizar formas de captação e esgoto clandestinos, precisam se deslocar a grandes distâncias para obter água ou utilizam reservatórios domiciliares desprotegidos. Esta realidade que está representada na Vila das Torres, cuja assistência aos serviços hídricos não atende a todos os moradores, incapacita-os de enfrentarem os impactos de esgotos clandestinos que desaguam no rio Belém, para além de suas fronteiras.

Embora em um primeiro momento a solução para a questão da acessibilidade à água potável pareça estar além de qualquer possibilidade de ruptura com sistemas tão consolidados, é possível encontrar na América Latina dois exemplos bem-sucedidos na Bolívia e no Equador57. Em ambos os casos foi incluída na Constituição a sabedoria ancestral voltada para a preservação da natureza e o bem-viver, que partem da perspectiva comunitário como pressuposto para decisões ambientais. A solução se apresentou na mudança de paradigmas, na redistribuição do poder, na libertação do espelho eurocêntrico, na ecologia dos saberes e na perspectiva da natureza como sujeito de direito58. A partir do momento que a natureza é compreendida como um interessado na sua própria saúde e na preservação da vida, novas possibilidades, conhecimentos tradicionais e tecnológicos podem ser utilizados na defesa dos recursos naturais e vale ressaltar, não apenas para se gerar mais lucro.

Houve uma superação do antropocentrismo, sendo instituído o ecocêntrismo como paradigma ético por meio de uma mudança de consciência. Nesse contexto, reconhece-se e atribui-se valor ao meio ambiente, sendo inaceitável a apropriação econômica e privada dos serviços ambientais. Para tal, foi necessária uma resistência dos povos originários e da sociedade contra o poder hegemônico dos países do Norte e da privatização da água, por meio de uma mobilização social que resultou no movimento do novo constitucionalismo latino-americano59.

A partir do reconhecimento da natureza como sujeito de direito e da gestão da água ficar sob a responsabilidade estatal, balizadas por normas constitucionais e regionais em defesa do patrimônio natural, foi possível efetivar o direito fundamental de acesso à água e ao saneamento com qualidade e sem hierarquização de direitos. As políticas públicas devem ser firmadas como planos de gestão coletiva, mediadoras de tomada de decisão e orientadoras de ações dos governos e da sociedade. Irigaray e Souza60 levantaram o potencial das iniciativas bolivianas e equatorianas de incentivarem outros países da América Latina a lançarem-se em uma transferência de uma nova ordem constitucional de inserção das comunidades, sinalizadas por princípios de solidariedade, de informação e de educação, sugestões que, diga-se de passagem, encontram respaldo nas perspectivas de Potter61 e de Boaventura62.

O legado ético: a perspectiva brasileira

Ao refletir sobre a realidade apresentada por Curitiba, faz-se necessário realizar um paralelo com a vivência do acesso à água potável no Brasil. O reconhecimento do país pela abundância de suas águas —contemplando-se o aquífero Guarani63, um dos maiores do mundo64—, acende o alerta à realidade brasileira que pode ser tomada como ponto de base para o estabelecimento de linhas interpretativas para soluções éticas no enfrentamento e superação dessa crise. A cena que abre este ensaio sobre a Vila das Torres desponta como uma oportunidade de congregar as expectativas de Potter e as soluções de Boaventura, a fim de transpor, para além, o problema dos rios urbanos, numa perspectiva de direitos de todos os seres vivos que coabitam em uma cidade e, assim possam dispor de elementos essenciais para sua sobrevivência e qualidade de vida65.

No Brasil existem inúmeros instrumentos legais e políticas públicas voltados para a garantia do acesso à água potável que representa 12% da água doce do mundo Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico (ANA), sendo que a Amazônia contém 70% desse montante, cujo acesso varia com a região. Assim, a cobertura do sistema de distribuição e as perdas nas regiões brasileiras, respectivamente, são: Sul 91% e 36,7%; Sudeste 91,3% e 38,1%; Centro/oeste 90,9% e 34,2%; Nordeste 74,9% e 46,3; e Norte 58,9% e 50,2%66. Em 1997 foi promulgada a Lei 9.43367 que cria a Política Nacional de Recursos Hídricos e o Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos baseadas nos fundamentos sobre a água: a) é um bem de domínio público; b) é um recurso natural limitado, dotado de valor econômico; c) em situações de escassez, o uso prioritário dos recursos hídricos é o consumo humano e a dessedentação de animais; d) a gestão dos recursos hídricos deve sempre proporcionar o uso múltiplo das águas; e) a bacia hidrográfica é a unidade territorial para implementação da Política, sendo justificada a cobrança pelo uso de recursos hídricos para reconhecimento da água como bem econômico; f) deve-se incentivar a racionalização do uso da água; e g) obter recursos financeiros para o financiamento dos programas e intervenções contemplados nos planos de recursos hídricos. Contudo, finaliza que a gestão dos recursos hídricos deve ser descentralizada e contar com a participação do Poder Público, dos usuários e das comunidades.

Em 2000 a Lei 9.98468 criou ANA, representando uma tentativa de o Estado melhorar a gestão, vinculando o acesso à água à política pública de desenvolvimento social de combate à fome, justificada no uso da água para consumo humano e para a produção de alimentos como parte da segurança alimentar e nutricional. No entanto, apenas em 2010 a alimentação foi incluída entre os direitos sociais previstos na Constituição Federal brasileira, por meio do Direito Humano de Alimentação Adequada (DHAA)69 e a ONU70 decreta que a água limpa e segura é um direito humano essencial para gozar plenamente a vida. Contudo, Irigaray e Souza 71 pontuam que é um direito sem efeito, pois avanços nos aspectos normativos e nas conferências e acordos internacionais não têm refletido em mudanças efetivas. Deve-se considerar, ainda, a importância dos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS), nos quais, segundo Cini e colaboradores72, há uma incompletude relevante dos objetivos —que intencionam o extermínio da pobreza e da fome e o acesso universal à água até 2030—, pois foram eximidas questões como a importância da agroecologia, o risco do uso de organismos geneticamente modificados e as doenças crônicas não transmissíveis.

A Agenda dos ODS auxilia para a criação de “um novo clima mundial capaz de influenciar uma modificação favorável” na distribuição de água e de serviços sanitários “para uma sociedade mais vulnerável e em desvantagem”73. Entretanto, os investimentos insuficientes privam cada vez mais pessoas susceptíveis de atingir esse objetivo. A sociedade necessita enfatizar que a saúde, a partir de um consumo apropriado e suficiente de água potável, é um tema recorrente conectado a todas as metas da Agenda 203074.

As vulnerabilidades decorrentes do mal-uso da água e os impactos da crise hídrica na saúde global, identificados por Rosaneli et al75, foram refletidos sob a perspectiva bioética, demostrando que para suprir condições mínimas para sobrevivência faz-se premente que haja um pacto social a nível individual, coletivo, institucional e governamental. Garcias76 mapeou os estudos desenvolvidos na Universidade que vizinha à Comunidade da Vila das Torres, sendo que dentre as soluções técnicas de contenção de poluição e de inundações e a recuperação física do rio, reiterou a importância da interação com a comunidade. Situações de vulnerabilidade social como as vivenciadas igualmente em outras tantas comunidades, carecem até mesmo de diálogo sobre a própria condição do rio. Segundo o mesmo autor, decisões baseadas em discussões não esgotadas podem levar a equívocos, tal como a canalização dos rios e o descuido com populações que ocupam irregularmente suas margens, demostrando baixa capacidade de enfrentamento, aumentando riscos e dificultando a implementação de soluções. A questão se potencializa quando todos são simultaneamente responsáveis e vítimas e quando as origens e repercussões são globais. Para isso, Rosaneli et al77 apontam que a bioética é fundamental na comunicação entre os diferentes níveis hierárquicos que permeiam as decisões plurais, globais e complexas, tanto no sentido individual, como no coletivo.

Os danos morais pela exclusão de acesso à água e ao saneamento são insustentáveis sob o ponto de vista dos direitos humanos, da justiça social e ambiental78. Fischer et al.79 discutiram o papel dos conselhos comunitários e pontuaram que o envolvimento de toda a sociedade na tomada de decisões pode potencializar a governança e regular o uso ético da água. Os comitês de bacias hidrográficas, funcionando como conselho ambiental, foram considerados por Abers80 como instituições bem-sucedidas, reconhecendo-os como espaços deliberativos, nos quais a sociedade civil pode estar inserida no controle social das políticas hídricas.

No meio acadêmico, Fischer et al.81 revisitaram publicações a respeito da crise hídrica e atestaram que, até então, privilegiavam-se questões técnicas em detrimento da dimensão ética. Populações vulneráveis em diversos países estão expostas à violação dos direitos e do acesso à água potável, ao saneamento e ao esgotamento sanitário, sendo isso um fenômeno no nível macrossocial. Reconhecer a importância de análise detalhada dos recursos existentes relacionados à falta de respeito pelos direitos humanos em atender em diferentes comunidades e, claro, à desigualdade de acesso existente é um monitoramento que a bioética representa, sendo um dos caminhos para emancipação dos grupos desamparados, para que sejam protegidos e tenham seus direitos respeitados82.

Faz-se necessário ressignificar a água de um recurso natural apenas para uma entidade possível de se estabelecer um diálogo. Essa profunda transformação de paradigmas demanda uma mobilização emocional e espiritual, a fim de que sejam estabelecidas conexões verdadeiras com o ambiente. A capacidade de resolução da crise hídrica também encontra potencial nos referenciais éticos da gestão responsável e no acolhimento da temática nas pautas da agenda da bioética, em especial no seu segmento da bioética ambiental. A percepção socioambiental de moradores da Vila das Torres entrevistados por Santos83 revelou que aquelas pessoas identificam como principais problemas ambientais a poluição do rio Belém, o acúmulo de lixo, o saneamento insuficiente, o esgoto a céu aberto, a pouca área verde, a presença de ratos e insetos, o desperdício de água, a contaminação do solo e a falta de pavimentação. Por outro lado, revelaram laços afetivos com o local e consideraram bom para viver apontando benefícios tais como a localização central. Quase a totalidade dos entrevistados nunca participou de tomadas de decisão referentes à comunidade, sendo que apenas 25% revelaram conhecer programas ou projetos desenvolvidos no local, exemplificando o “Projeto Peá” e o “Centro de apoio à Integração Comunitária”. Acrescente-se a isso o não reconhecimento da atuação da prefeitura, o que resulta em insatisfação e em conclamação por soluções, como prover mais arborização e mais áreas de lazer, melhorar as condições do rio e até mesmo canalizar o curso de água para evitar o despejo de lixo, porém, apontando que a maior responsabilidade sobre o meio ambiente local é do morador84.

Para Rosaneli e Fischer85 a escassez ou mesmo finitude das águas é resultado de um sistema ineficiente e descuidado, daí, em contrapartida, há a necessidade de uma rede e de uma plataforma global para unir esforços e compartilhar soluções inovadoras, sendo uma forma de promover o desenvolvimento sustentável social, econômico e ambiental e, consequentemente, melhorar a saúde e a qualidade de vida dos seres humanos e do planeta86. Dessa forma, em relação às questões ambientais postas, vislumbrando-se o acesso à água de forma digna e justa, tanto para as pessoas como para outros seres vivos, a Vila das Torres, foi escolhida aqui como modelo referencial para essa reflexão, representando um cenário que poderia ser em uma área urbana de qualquer região do mundo. O discurso ecológico que baliza o posicionamento das cidades inteligentes mundiais é incompatível com a realidade. Essa dissonância cognitiva, segundo Souza-Lima87, constitui-se de um discurso no qual Curitiba fala para si mesma, na tentativa de realizar no universo da retórica, tudo aquilo que não consegue realizar no mundo prático. Dito isso, cabe reforçar, ainda, que os meios de comunicação expõem os problemas que são limitantes para a qualidade de vida de seus moradores.

As cidades enfrentam desafios para gerenciar os sistemas de abastecimento, portanto, será a gestão integrada, sustentável e participativa que possibilitará a harmonização entre a demanda e a qualidade do recurso, assim como o acesso primordial aos mais vulneráveis. Para Schramm88 a pluralidade moral das sociedades complexas potencializa a condição de vulneração dos meios de vida, empobrecendo o ser humano em sua existência, bem como a finitude da natureza, como é o caso da Vila das Torres, onde é possível presenciar violações aos direitos humanos e ambientais, mas que, por uma irrealidade do cotidiano, pode-se revelar em uma realidade aceitável89.

Logo, como balizador mais eficiente para a solução de acessibilidade à água potável, ao saneamento básico e a recuperação de rios urbanos, os direitos humanos deveriam assegurar o direito à água que se estabelece como princípio ético e moral, porque é do cuidado a esse bem maior e finito que a vida é dependente. Para a DUBDH90 um dos princípios fundamentais, sob o ponto de vista da Bioética e dos direitos humanos, é o da água como condicionante para a sobrevivência e a dignidade humana. A responsabilidade social pede que as questões sociais como a pobreza e bem-estar das gerações futuras possa priorizar uma vida justa de todos os povos e todos os seres vivos. Nesse momento, provavelmente Boaventura traria a justiça social relacionada a um mundo globalizado, onde a água é fundamental para a sobrevivência humana, mas também envolta por profunda desigualdade. Rosaneli et al.91 analisaram o comprometimento dos diferentes atores e das ciências no uso ético da água, processo primordial para a superação das atuais vulnerabilidades. Os autores fundamentam que a água e a saúde humana são codependentes, consequentemente não podem ser negligenciadas. Assim como Potter e Boaventura pontuam para os recursos finitos, é preciso garantir o direito humano de acesso à água para todos, pois a crise hídrica pode se agravar em um processo insustentável para a natureza e para os seres humanos e não-humanos, comprometendo o sistema ecológico como um todo, não apenas para a vida na Vila das Torres, mas promovendo mudanças climáticas globais, extinção de espécies e ecossistemas e automaticamente impactando o ciclo natural da água.

Considerações finais

Os dados levantados a partir do recorte proposto no presente ensaio crítico viabilizaram a oportunidade de agregar a perspectiva de Potter e de Boaventura na reflexão sobre as vulnerabilidades e soluções para o acesso universal à água potável, tomando-se como cenário vida dos moradores da Vila das Torres, e a naturalidade de como a situação está apresentada socialmente aos que lá vivem, aos que lá transitam, ou aos que lá imaginam um futuro. O encontro entre Potter e Boaventura promoveu, assim, inspirações para a construção de um legado bioético da universalização do acesso à água potável composto do passado para viver um futuro digno a todos, buscando na prevenção de possíveis danos, precaução frente ao desconhecido, prudência com relação aos avanços e novidades tecnológicas, proteção dos excluídos sociais e perseverança constante nas ações e dificuldades.

Buscando responder ao questionamento do que ainda é preciso falar sobre a universalização do acesso à água potável, concluiu-se que já não há o que ser dito. O mundo já dispõe de um arsenal técnico para captação, distribuição e tratamento. Igualmente já se é sabido dos direitos de todos os seres vivos ao elemento vital para sua existência, dos fatores que favorecem a desigualdade ao acesso e do risco da mercantilização da água. Embora Potter não tenha alcançado vivenciar suas expectativas mais catastróficas, seu legado diz à comunidade da Vila das Torres que a técnica precisa de sua voz, para que os valores éticos ecoem como balizadores das decisões técnicas. Por outro lado, Boaventura poderia encontrar-se com moradores da Vila das Torres e talvez dizer que os enxerga mesmo sufocados em um complexo de interesses políticos, porém alertaria para a importância do protagonismo para o exercício da democracia, bem como para acreditarem nas mudanças propostas quando de fato as vivenciassem em seus cotidianos. Para Boaventura o futuro começa no mundo pós-pandêmico, que teme a expectativa de viver em um estado de emergência intermitente e permanente92.

A perspectiva da Bioética Ambiental desponta como alternativa, uma vez que visa atender às expectativas multidisciplinares de Potter e Boaventura, subsidiada pela convergência dos conhecimentos científicos, tecnológicos e tradicionais que buscam proteger a natureza, a cultura, a dignidade e a esperança de todos os seres vivos que compõe os ecossistemas urbanos para além da Vila das Torres. Faz-se necessário ressignificar a água de um recurso para uma entidade possível de se estabelecer um diálogo. Consequentemente, a Bioética Ambiental destaca-se como um dos sustentáculos da afirmação dos direitos humanos e dos direitos da natureza, corroborando ser o problema do acesso universal à água potável como complexo, plural e global, mas também cooperando e aprimorando as decisões voltadas à sobrevivência humana e do planeta, além da responsabilidade com as futuras gerações denunciando que a violência contra a natureza é uma violência contra as pessoas, logo contra a humanidade.

O cenário perceptivo do presente ensaio pode trazer interpretações paradoxais, ou seja, se de um lado é possível presenciar uma sociedade invisibilizada diante da incongruência que é imposta do modelo idealizado de como usufruir o lazer ao ar livre, mesmo diante da inexistência real desse cenário, por outro lado, percebe-se que a sociedade ocupa os espaços disponibilizados acessando com esperança um bem coletivo que é o seu direito. A expectativa para uma cena futura é saber qual dos lados crescerá invadindo as fronteiras.

Referências

Abers, Rebecca Neaera; Formiga-Johnsson, Rosa Maria; Frank, Beate; Keck, Margaret Elizabeth; Lemos, Maria Carmen. 2009: “Inclusão, deliberação e controle: três dimensões democracia nos comitês e consórcios de bacias hidrográficas no Brasil”. Ambiente & Sociedade, 12(1), 115–132. https://doi.org/10.1590/S1414-753X2009000100009

Brasil. Política Nacional de Recursos Hídricos Instituída. 1997: Lei nº 9.433 de 8 de janeiro de 1997. http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9433.htm

Brasil. Presidência da República. Subchefia para assuntos jurídicos. 2000: Lei n. 9.984 de 17 de julho de 2000. http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L9984compilado.htm

Brown, Colin; Neves-Silva, Patrícia; Heller, Leo. 2016: “Direito Humano à água e ao esgotamento sanitário: uma nova perspectiva para as políticas públicas”. Cien Saude Colet., 21 (3), 661–670. https://doi.org/10.1590/1413-81232015213.20142015

Carvalheiro, Jose da Rocha. 2015: “Água e saúde: bens públicos da humanidade”. Estudos Avançados, 29(84), 139–149. https://doi.org/10.1590/S0103-40142015000200009

Cini, Ricardo; Rosaneli, Caroline Filla; Fischer, Marta Luciane. 2019: “Derecho humano al agua y bioética: revisión de la literatura latino-americana centrada en la realidad brasileña”. Agua y Territorio / Water and Landscape, (14), 105–114. https://doi.org/10.17561/at.14.4450

Cini, Ricardo; Rosaneli, Caroline Filla; Sganzerla, Anor. 2019: “Soberania alimentar na agenda de desenvolvimento sustentável”. Monções, 8(16), 458–489. https://doi.org/10.30612/rmufgd.v8i16.9574

Duarte, Fabio. 2006: "Rastros de um rio urbano: cidade comunicada, cidade percebida." Ambiente & Sociedade, 9(2), 105–122. https://doi.org/10.1590/S1414-753X2006000200006

FAO et al. 2022. “The State of food security and Nutrition in the World”. https://www.fao.org/3/cc0639en/cc0639en.pdf

Fischer, Marta Luciane; Cunha, Thiago; Rosaneli, Caroline Filla. 2016: “Crise hídrica em publicações científicas: olhares da bioética ambiental”. Revista Ambiente y Água, 11(3), 586–600. https://doi.org/10.4136/ambi-agua.1879

Fischer, Marta Luciane; Rosaneli, Caroline Filla. 2022: "A “fome de água” e sua dimensão ambiental, biológica y bioética." Revista Inclusiones 9, 336–352. https://doi.org/10.58210/fprc3402

Fischer, Marta Luciane; Rosaneli, Caroline Filla; Cunha, Thiago Rocha; Sganzerla, Anor; Molinari, Renata Bicudo; Cini, Ricardo. 2018: “Comunicações sobre a crise hídrica: a internet como ferramenta de sensibilização ética”, Sustentabilidade em Debate, 9(1), 158–171. https://doi.org/10.18472/SustDeb.v9n1.2018.25756

Fischer, Marta; Cunha, Thiago; Renk, Valquiria; Sganzerla, Anor; Santos, Juliana. 2017: “Da ética ambiental à bioética ambiental: antecedentes, trajetórias e perspectivas” Hist. cienc. saude-Manguinhos, 24 (2), 391–409. https://doi.org/10.1590/S0104-59702017000200005

Fischer, Marta Luciane; Stramantino, Jaqueline; Lummertz, Thierry; Rosaneli, Caroline. 2021: “Crise hídrica: a culpa é de quem? A percepção das responsabilidades em espaço de deliberação virtual”. Caminhos de Diálogo, 15, 225–247. http://doi.org/10.7213/cd.a9n15p225-247

Flausino, Fabio Richard; Gallardo, Amarilis Lucia Casteli Figueiredo. 2021: “Oferta de serviços ecossistêmicos culturais na despoluição de rios urbanos em São Paulo.” Urbe. Revista Brasileira de Gestão Urbana, 13, e20200155. https://doi.org/10.1590/2175-3369.013.e20200155

Garcias, Carlos Mello. 2016: “Experiências na revitalização do Rio Belém: Realidades urbanas do Brasil”. Revista Eletrônica de Gestão e Tecnologias Ambientais, 4(1), 50–68. https://doi.org/10.9771/gesta.v4i1.14910

Gomes, Fulvio Moraes. 2012: “As Epistemologias do Sul de Boaventura de Sousa Santos: por um resgate do sul global”. Páginas de Filosofia, 4(2), 39–54. https://doi.org/10.15603/2175-7747/pf.v4n2p39-54

Instituto Trata Brasil, 2022: Principais estatísticas no Brasil. https://tratabrasil.org.br/principais-estatisticas/agua/

Irigaray, Micheli Capuano; Souza, Elany Almeida. 2018: “Políticas Públicas De Acesso À Água E Ao Saneamento: Uma Perspectiva Decolonial De Garantia De Direitos Fundamentais”. Conpedi Law Review, 4(2), 56–73. https://doi.org/10.26668/2448-3931_conpedilawreview/2018.v4i2.4618

Jalomo-Aguirre, Francisco; Rodrigues, Alicia Torres; Ceballos-Gonzáles, Leonor; Alba, Juan Pablo. 2018 “Derecho humano al agua potable en la localidad de Tlachichilco del Carmen en el municipio de Poncitlán, Jalisco, México: análisis preliminar de un problema en un territorio periurbano”. Agua y Territorio / Waterd and Landscape, (12), 59–70. https://doi.org/10.17561/at.12.4069

Leão, Marília. 2013: “O direito humano à alimentação adequada e o sistema nacional de segurança alimentar e nutricional”. Brasília: ABRANDH. https://www.mds.gov.br/webarquivos/publicacao/seguranca_alimentar/DHAA_SAN.pdf

Miranda, Sandro Ari Andrade. 2017: “A Crise Ecológica, O Epistemicídio e a Destruição dos Saberes”. Revista Saberes da Amazônia, 2(4), 3–14. https://doi.org/10.31517/rsa.v2i4.119

Moraes, Germana Oliveira. 2013: “O constitucionalismo ecocêntrico na América Latina, o bem viver e a nova visão das águas”. R. Fac. Dir.: Fortaleza, 34(1), 123–155.

Nunes, João Arriscado; Louvison, Marília. 2020: “Epistemologias do Sul e descolonização da saúde: por uma ecologia de cuidados na saúde coletiva”. Saúde e Sociedade, 29(3), e200563. https://doi.org/10.1590/S0104-12902020200563

ONU. Organização das Nações Unidas. 2015: “Transformando Nosso Mundo: A agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável”. https://nacoesunidas.org/wp-content/uploads/2015/10/agenda2030-pt-br.pdf

ONU. Organização das Nações Unidas. 2010: “Água para a Vida, 2005-2015.” Zaragoza: ONU. https://www.un.org/waterforlifedecade/pdf/human_right_to_water_and_sanitation_media_brief_por.pdf

ONU. Relatório mundial das Nações Unidas sobre desenvolvimento dos recursos hídricos. 2021: “O valor da água: resumo executivo”. Perúgia (Itália), ONU. https://unesdoc.unesco.org/ark:/48223/pf0000375750_por

Pontes, Carlos Antonio Alves; Schramm, Fermin Roland. 2004: “Bioética da proteção e papel do Estado: problemas morais no acesso desigual à água potável”. Cad. Saúde Pública, 20(5), 1319–137. https://doi.org/10.1590/S0102-311X2004000500026

Potter, Van Rensselaer. 2016: “Bioética: ponte para o futuro”. São Paulo, Edições Loyola.

Potter, Van Rensselaer. 2018: “Bioética global”. São Paulo, Edições Loyola.

Requião, Danielle; Fernandes, Mayala; Anastácio, Thiago. 2021: “Vila Torres: um lugar de pertencimento - Uma comunidade além do estereótipo, repleta de cultura e memória. https://www.plural.jor.br/noticias/vizinhanca/vila-torres-um-lugar-de-pertencimento/

Ribeiro, Wagner Costa. 2008: "Aqüífero Guarani: gestão compartilhada e soberania." Estudos avançados 22, 227–238. https://doi.org/10.1590/S0103-40142008000300014

Rosaneli, Caroline Filla; Fischer, Marta Luciane. (Org). 2021: Bioética, saúde global e meio ambiente. Curitiba (Brasil). CRV. https://www.editoracrv.com.br/produtos/detalhes/36228-bioetica-saude-global-e-meio-ambientebrbr-serie-bioetica-volume-14

Rosaneli, Caroline; Brotto, Aline; Pieri, Lucas; Fischer, Marta. 2021a: “E O Mar Virou Sertão? As Vulnerabilidades da Seca nas Metrópoles”. DRd - Desenvolvimento Regional em debate, 11, 250–274. https://doi.org/10.24302/drd.v11.3436

Rosaneli, Caroline; Brotto, Aline; Pieri, Lucas; Fischer, Marta. 2021b: “O legado ético no enfrentamento da pandemia covid-19: a sinergia entre a perspectiva global e a identidade regional”. Holos, 37(4), 1–19. https://doi.org/10.15628/holos.2021.11414

Rosaneli, Caroline; Fischer, Marta; Sganzerla, Anor; Paulo, Alberto. 2022: “Interação água e saúde global: uma questão bioética”. Agua y Territorio, 19, 111–124. https://doi.org/10.17561/AT.19.5471

Santos, Boaventura Santos. 2018: “Construindo as Epistemologias do Sul: Antologia esencial: Volume II: Para um pensamento alternativo de alternativas”. 1a ed. Ciudad Autónoma de Buenos Aires: CLACSO.

Santos, Boaventura Santos. 2021: “O futuro começa agora: da pandemia à utopia”. São Paulo: Boitempo Editorial.

Santos, Elenir Almeida. 2011: A percepção socioambiental dos moradores da vila torres - Curitiba/Pr: subsídios à implementação de políticas públicas. Universidade Federal do Paraná [Trabalho de Conclusão de Curso]. Especialização em Educação, Meio Ambiente e Desenvolvimento. https://acervodigital.ufpr.br/bitstream/handle/1884/43256/R%20-%20E%20-%20ELENIR%20ALMEIDA%20SANTOS.pdf?sequence=1&isAllowed=y

Schramm, Fermin Roland. 2008: “Bioética da Proteção: ferramenta válida para enfrentar problemas morais na era da globalização”. Revista Bioética, 16(1), 11–23. https://www.ghc.com.br/files/BIOETICA%20DE%20PROTECAO.pdf

Souza-Lima, José Edmilson. 2006: “A construção do imaginário ecológico de Curitiba - o preço da fama”. In Oliveira, G. B.; & Lima, E. S. (Org.), O Desenvolvimento sustentável em foco: uma contribuição multidisciplinar. São Paulo: Annablume.

Stramantino, Jaqueline; Farias, Marina; Rosaneli, Caroline; Fischer, Marta. 2022: "Água e cidades numa perspectiva de conhecimento acadêmico e popular relacionada aos recursos hídricos para cidades inteligentes." Holos, 4, e13961. https://doi.org/10.15628/holos.2022.13961

UNESCO. 2015. “Declaração Universal sobre Bioética e Direitos humanos“. https://unesdoc.unesco.org/ark:/48223/pf0000146180_por

_______________________________

1 Vila Torres: um lugar de pertencimento. https://www.plural.jor.br/noticias/vizinhanca/vila-torres-um-lugar-de-pertencimento/

2 https://www.curitiba.pr.gov.br/noticias/maior-parte-dos-moradores-da-vila-das-torres-tem-casa-propria/448#:~:text=A%20popula%C3%A7%C3%A3o%20neste%20compartimento%20da,e%2049%2C3%25%20mulheres y https://www.facebook.com/viladastorres/

3 Requião et al., 2021.

4 Santos, 2011.

5 Stramantino et al., 2022.

6 Stramantino et al., 2022.

7 Matadouro Municipal do Guabirotuba. https://www.memoriaurbana.com.br/matadouro-municipal-guabirotuba/o-rio-belem/

8 https://www.curitiba.pr.gov.br/noticias/prefeitura-e-comunidade-promovem-recuperacao-do-rio-belem-na-vila-torres/53576

9 https://www.curitiba.pr.gov.br/noticias/amigo-dos-rios-leva-educacao-ambiental-a-mais-de-27-mil-pessoas/51729

10 Pinturas de Pessoas em piqueniques nos parques e jardins. https://deniseludwig.blogspot.com/2014/02/pinturas-de-piqueniques-em-parques-e.html

11 Potter, 2018.

12 Santos, 2018.

13 https://www.curitiba.pr.gov.br/noticias/curitiba-e-a-cidade-mais-inspiradora-do-mundo-em-preservacao-de-areas-verdes/63933

14 Instituto Trata Brasil, 2022. https://tratabrasil.org.br/wp-content/uploads/2022/09/Resumo_Executivo_-_Ranking_22.pdf

15 Stramantino et al. 2022.

16 Fischer et al., 2021. Fischer; Rosaneli, 2022.

17 Potter, 2016.

18 Fischer et al., 2017. Fischer et al., 2018.

19 Potter, 2016.

20 Potter, 2016.

21 Potter, 2016.

22 Potter, 2018.

23 Potter, 2018.

24 Potter, 2018.

25 Potter, 2018.

26 Potter, 2016.

27 Stramantino et al., 2022.

28 Santos, 2018.

29 Santos, 2018.

30 Santos, 2021.

31 Santos, 2018.

32 Potter, 2018.

33 Flausino; Gallardo, 2021.

34 Santos, 2018.

35 Potter, 2018.

36 Rosaneli et al., 2021a. Stramantino et al., 2022.

37 Fischer; Rosaneli, 2022.

38 Stramantino et al., 2022.

39 Pontes e Schramm, 2004.

40 Moraes, 2013.

41 Stramantino et al., 2022.

42 Santos, 2018.

43 Gomes, 2012.

44 Miranda, 2017.

45 Miranda, 2017.

46 Nunes; Louvison, 2020.

47 Gomes, 2012.

48 Santos, 2011.

49 FAO et al., 2022.

50 ONU, 2021.

51 ONU, 2021.

52 Fischer; Rosaneli, 2022.

53 Irigaray; Souza, 2018.

54 Irigaray; Souza, 2018.

55 Pontes; Schramm, 2004.

56 Pontes; Schramm, 2004.

57 Irigaray; Souza, 2018.

58 Santos, 2018.

59 Irigaray; Souza, 2018.

60 Irigaray; Souza, 2018.

61 Potter, 2018.

62 Santos, 2018.

63 Ribeiro, 2008.

64 Ribeiro, 2008.

65 Stramantino et al., 2022. Fischer; Rosaneli, 2022.

66 Instituto Trata Brasil, 2022.

67 Brasil, 1997.

68 Brasil, 2000.

69 Leão, 2013.

70 ONU, 2010.

71 Irigaray; Souza, 2018.

72 Cini; Rosaneli; Sganzerla, 2019.

73 Brown; Neves-Silva; Heller, 2016.

74 ONU, 2015.

75 Rosaneli et al., 2022.

76 Garcias, 2016.

77 Rosaneli et al., 2022.

78 Jalomo-Aguirre, et al., 2018. Carvalheiro, 2015. Santos, 2018.

79 Fischer; Cunha; Rosaneli, 2016.

80 Abers et al. 2009.

81 Fischer; Cunha; Rosaneli, 2016.

82 Cini, Rosaneli; Fischer, 2019. Cini; Rosaneli; Sganzerla, 2019.

83 Santos, 2011.

84 Duarte, 2006.

85 Rosaneli; Fischer, 2021.

86 Stramantino et al., 2022. Rosaneli et al., 2021b.

87 Souza-Lima, 2006.

88 Schramm, 2008.

89 Santos, 2011.

90 UNESCO, 2015.

91 Rosaneli et al., 2022.

92 Santos, 2021.